PENTECOSTES, PLENIFICAÇÃO DO MISTÉRIO PASCAL
No
AT (Lv 23,15-21; cfr.: Ex 23,16;
34.22-23) Pentecostes é chamado SHAVOUT (semanas) que literalmente significa a festa das sete semanas, a partir do
segundo dia da PESSACH (Páscoa), daí o
nome Pentecostes, que significa
"qüinquagésimo dia". Tratava-se de uma das três festas de
peregrinação para celebrar os frutos da colheita e para lembrar a revelação do
Decálogo a Moisés no monte Sinai. Ainda hoje, os judeus no dia de Pentecostes
costumam ler o Decálogo nas Sinagogas. Durante a leitura, todos ficavam de pé e
a sinagoga era decorada com flores e plantas para lembrar que o monte Sinai,
montanha seca e árida, explodiu em flores no momento da revelação do Decálogo. Vinha
gente de toda a parte: judeus saudosos que voltavam a Jerusalém, trazendo
também pagãos amigos e prosélitos. Eram oferecidas as primícias das colheitas
no Templo.
No
NT Pentecostes é descrito nos Livro
dos Atos (2,1-13): os discípulos com Maria receberam o Espírito Santo predito pelos
Profetas (Is 32,15-20; Ez 37,14, Joel 2,28ss) e por João Batista (MT 3,11; Mc
1,8; Lc 3,16), e prometido por Jesus (Lc 11,13;12,12; Jo 3,5-6; 7,39;14,7.26;
15,26; 16,13). Também no Pentecostes do NT está presente a ideia de colheita:
as primícias da colheita aconteceram naquele dia, pois foram muitos os que se
converteram e foram recolhidos para o Reino (At 2,41).
Aos
Apóstolos Jesus tinha prometido que não os teria deixado sozinhos e que lhes
teria enviado o Espírito (Jo 14,16,26), não se justificando, portanto, a perturbação que Jesus notara em seus
rostos (Jo 14,1). Em Pentecostes a Igreja celebra a realização desta promessa.
Pentecostes é, então, a plenificação da Páscoa, pois o próprio Jesus deixa
entender que uma vez ressuscitado vai pedir ao Pai o envio do Espírito (Jo
16,7) e só então é que os Apóstolos vão entender realmente quem é Jesus, pois
serão encaminhados para toda a verdade
(Jo 16,13).
No
Novo Testamento encontramos duas versões do acontecimento de Pentecostes, a de
João, no mesmo dia da Ressurreição, e a de Lucas, cinqüenta dias depois. A
versão de Lucas quer ressaltar a missão
universal da Igreja, como sinal de unidade entre todos os povos convocados
agora no novo Povo, unidade esta
realizada pelo Espírito Santo. A versão de João quer ressaltar o princípio da vida nova surgida da Páscoa de
Cristo, aproximando entre eles no tempo e no espaço, Páscoa e Pentecostes.
É preciso constatar também que todo o evangelho de João exige como sua
conclusão um Pentecostes; com efeito desde o início é feita a promessa: haverá
um batismo no Espírito Santo (Jo 1,33), promessa esta confirmada e detalhada no
diálogo com a samaritana (Jo 4,14).
Pentecostes,
mesmo em sua própria dimensão pneumatológica é, sobretudo, um mistério
cristológico, pois o envio do Espírito está em função da compreensão do
mistério de Jesus, como explica Pedro no primeiro anúncio da Ressurreição: “Exaltado à direita de Deus, recebeu do Pai o
Espírito Santo e o distribuiu conforme vedes e ouvis” (At 2,33).
Mas
é um mistério cristológico também porque o Espírito enviado não é senão o
“Espírito de Jesus”, que ele possui em plenitude (Jo 1, 33; cfr. 1Sm 16,32), o Espírito do Filho, e ainda porque este
Espírito é derramado sobre a Igreja que é Corpo de Cristo. Aliás, somos
batizados no Espírito para formarmos o Corpo, a Igreja, Corpo de Cristo, como
diz são Paulo.
O
próprio Jesus esclareceu a função do Espírito, quando afirmava que “Ele (o Espírito) vai receber daquilo que é meu, e o interpretará para vocês” (Jo 16,
14) e “ensinará a vocês todas as coisas e
fará vocês lembrarem tudo o que eu lhes disse” (Jo 14, 26), e “encaminhará vocês para toda a verdade
(Jo 16,13).
A
estrita relação entre o Espírito e Jesus, levou os Padres a fazer uma ligação
entre Jesus, o Espírito e o Batismo: a função do Espírito é fazer do batizado
um conformado, um configurado com Cristo na linha de são Paulo que falava de in-corporação ao Cristo.
O
trinômio Páscoa-Pentecostes-Batismo,
sobretudo na antiga Iniciação - uma única celebração em três ritos =
banho-crismação-Eucaristia - levou os Padres a falar de plenificação da Páscoa no Pentecostes e de plenitude do Batismo na Confirmação, justamente pela ação do
Espírito. No centro de tudo está o batismo: a ele fazem referência a Páscoa e o
Pentecostes. Esta centralidade voltou à tona, na teologia e na espiritualidade,
com o Concílio Vaticano II. É este o horizonte da vida cristã.
Reviver
hoje Pentecostes significa voltar a esta fonte: o batismo, pela ação do
Espírito nos configura com Cristo e, na Confirmação, o mesmo Espírito leva à
plenitude esta configuração. Esta realidade nada mais é do que a santificação, pois ser configurado com
Cristo significa revestir-se dele, assumindo suas feições de Filho querido no
qual o Pai encontra seu agrado (Mt 3,7).
O
nosso caminho para a santidade, cujo apelo foi retomado com o tempo de
quaresma, num processo de conversão contínua, recebe uma força especial que nos
vem do Espírito do Ressuscitado, que é o Santificador. A “função” do Espírito
Santo é de nos aproximar sempre de Cristo até nos revestir dele. Passar, como
diziam os Padres gregos, da imagem à semelhança de Jesus em nós e, então a
configuração com ele será perfeita: a isso somos chamados! Este é o caminho
para a santidade que realizamos com a força do Espírito, a “força do
alto”.
Não
podemos esquecer que esta é a vocação de todo batizado: a vocação universal à
santidade (LG 40). Para o Concílio Vaticano II a santidade tem uma dúplice
dimensão: a eclesial, pelo fato de
pertencermos à Igreja somos chamados à santidade, e cristológica, pois é comunicada à Igreja por Cristo e é definida
como “união perfeita com Cristo” (LG 50), mas ela é realizada pelo Espírito
Santo, o Santificador.
Na
vida religiosa esta vocação é retomada e, pela profissão dos conselhos
evangélicos, é levada à plenitude pela força do mesmo Espírito, invocado
expressamente com o canto da seqüência no momento da profissão. Como lembram as
Constituições da nossa Ordem: “A profissão religiosa exprime mais plenamente a
consagração batismal... para que se dediquem à santificação pessoal e ao bem da
Igreja” (nº 11). O apelo à santidade
“com ânimo alegre e prazeroso” é feito também no nº 36 das mesmas Constituições,
onde é lembrada, mais uma vez sua ligação com o batismo. A vida segundo o Espírito, sobre a qual são Paulo insiste como um refrão
é o objetivo da nossa vida. Vida segundo
o Espírito e vida em Cristo são
expressões que equivalem em São Paulo, pois é movidos pelo Espírito que nos
conformamos ao Cristo (Constituições,
nº 36).
Necessitamos
de ser “movidos pelo Espírito” porque vivemos em tensão entre as nossas
tendências naturais e as exigências da graça
e, sem a sua ação, não conseguiríamos tender à santidade. Por isso, a vida segundo o Espírito exige de nós,
junto com a graça, vigilância, prudência, perseverança e generosidade, numa
palavra: a santidade é graça e esforço de todo dia e de cada momento. É esta a finalidade da vida religiosa, antes
mesmo de qualquer apostolado, o qual, sem uma fundamentação na vocação para a
santidade pessoal e de outrem, a própria ação apostólica seria destinada ao
fracasso (NMI, 30).
A
vida religiosa, com seu ritmo de vida comunitária e apostólica, levando à
perfeição a vocação batismal, é um caminho para a santidade; e nós entramos
nela por este motivo. Isso não é isento de sacrifício, pois exige mística em tudo aquilo que fazemos:
oração pessoal e comunitária, intimidade com a Palavra de Deus, caridade
fraterna num relacionamento indulgente e de comunhão - pois o que conta é o
laço que nos une -, generosidade nos atos comunitários que sempre devem ter a
precedência em tudo, mesmo diante dos compromissos pastorais. Todo ato
comunitário é celebrativo da vida em fraternidade.
Nós
religiosos somos testemunhas de que “a Igreja é a revelação do Espírito Santo
no amor mútuo que nos leva ao Pai por seu Verbo encarnado”, como se expressava
o teólogo ortodoxo Khomiakov e, nesta dimensão trinitária, nós nos reconhecemos
perfeitamente. Mas esta realização deve acontecer, em primeiro lugar, entre
nós, através da vida fraterna como testemunho da presença e da ação do Espírito
do Ressuscitado em nós e entre nós.
Para a
reflexão
- Como o
horizonte da santidade está presente em minha vida?
- Em que
medida o meu caminho para a santidade está beneficiando os meus confrades?
Pe. frei Vincenzo Frisullo
Ministro conventual